Após conseguir aprovar medida, governo tenta convencer base a manter texto

Um dia após a votação da medida provisória de reestruturação do governo expor um racha na articulação política da gestão de Jair Bolsonaro, líderes do centrão fecharam um acordo com PSL e oposição que permitiu concluir nesta quinta (23) a aprovação da proposta na Câmara, mas manteve incertezas sobre seu futuro.
A estratégia para a apreciação do texto no Senado na semana que vem, às vésperas de a MP expirar, virou novo motivo de bate-cabeça do governo com seus próprios aliados.
A medida que, entre outros pontos, reduz de 29 para 22 o número de ministérios, precisa ser aprovada até 3 de junho. Caso contrário, ela perde a validade, e o Planalto teria que retomar a configuração da Esplanada do governo Michel Temer, com mais pastas.
O centrão, que reúne partidos como PP, DEM, PL (ex-PR), PRB, MDB e Solidariedade, demonstrou força na quarta-feira (22) ao aprovar a MP nas condições como defendia, retirando o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) das mãos do ministro da Justiça, Sergio Moro, e passando o órgão ao controle do Ministério da Economia.
Bolsonaro defendeu nesta quinta que o Senado aprove a medida provisória com esse formato aprovado pela Câmara, ao mesmo tempo em que parlamentares do próprio PSL falavam em tentar devolver o Coaf para a pasta de Moro –que o considera estratégico no combate à corrupção.
Em live transmitida nas redes sociais, Bolsonaro disse que a bancada federal do PSL tem de compreender que nem sempre é possível ganhar.
“No meu entender, deve aprovar o que foi votado na Câmara e vamos seguir em pautas mais importantes. A minha bancada, a do PSL, é uma bancada de parlamentares bastante novos. Alguns ainda acham que tem de ganhar todas. Não dá, a gente vai perder alguma votação. Sem problema algum”, disse.
Mais cedo, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), e o líder do PSL na Casa, Major Olímpio, defenderam que o resultado fosse modificado, tentando devolver o Coaf à Justiça.
A disputa é vista com preocupação no Planalto diante do risco de mais desgaste com o centrão, que poderia colocar toda a MP de estruturação do governo em xeque, a menos de uma semana de expirar.
No acordo que permitiu finalizar a votação do texto na Câmara nesta quinta, a estratégia do centrão levou em conta uma possível influência do protesto pró-Bolsonaro marcado para este domingo (26).
Os deputados desse bloco aceitaram retirar da MP o trecho que proíbe auditores da Receita Federal de fazerem comunicação ao Ministério Público de situações suspeitas.
Em troca, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se comprometeu a votar na próxima semana a urgência de um projeto de lei sobre o Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) —nele será incluída a mesma discussão sobre os auditores.
No plenário da Câmara, o líder do PP, Arthur Lira (AL), afirmou esperar que, diante do acordo, deputados “sem expressão, sem leitura, sem conhecimento, sem compromisso com a verdade” não ocupassem a tribuna “para tentar vilipendiar, miseravelmente e covardemente a hombridade de quem defende o que é certo”.
Os parlamentares do centrão também avaliaram que, ao apelar à pressão das redes sociais e ao discurso de que Congresso atuava para destruir o “patrimônio” da operação Lava Jato, a bancada do PSL e de siglas como o Podemos e o Novo conseguiriam virar votos de muitos deputados.
O exemplo mais claro de mudança de posição foi o PSD. Apesar de ter fechado acordo com o centrão para derrotar Moro, o partido de Gilberto Kassab votou em peso a favor do ministro de Bolsonaro —30 votos a favor de manter o órgão na Justiça contra 1 favorável à migração para a Economia.
Moro acabou derrotado por estreita margem —228 votos a 210. Os líderes do centrão esperavam uma vitória mais expressiva e dizem que o PSD rompeu em cima da hora.
Com isso, começaram logo depois da sessão a discutir possíveis retaliações, como a retirada de funções de relevo das mãos do partido.
No Senado, a preocupação do governo é que a bancada do PSL também se rebele e contrarie a orientação do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), para que seja aprovado o texto que saiu da Câmara e a votação aconteça sem intercorrências.
O senador Major Olímpio disse que vai brigar para devolver o Coaf ao Ministério da Justiça e afirmou esperar que o resultado da votação na Câmara leve as pessoas às ruas no domingo e aumente a pressão sobre os senadores.
Há um temor no Palácio do Planalto de que as investidas do PSL e seus aliados no Senado coloquem novamente em risco a validade da medida.
Assim que os deputados encerraram a votação, na manhã desta quinta, senadores começaram uma articulação para tentar conter na Casa a tensão que imperou na Câmara, na sessão de quarta.
Se o Senado modificar o texto aprovado pelos colegas do Salão Verde, a proposta precisa voltar para a Câmara. O prazo, no entanto, é curto, e líderes do centrão já sinalizaram não estar dispostos a apreciar o texto novamente.
A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), diz achar melhor tentar um acordo para garantir a votação.
“Qualquer coisa que tensione esta aprovação é ruim para o governo. Então, para todos os parlamentares, inclusive os do nosso partido, o PSL, o melhor caminho agora é arrefecer porque temos três anos e meio de governo pela frente”, disse a parlamentar, que, seguindo orientação de Bolsonaro, não irá a nenhum ato no fim de semana.
Parlamentares que participam das conversas dizem que Moro também se colocou à disposição para atuar nos bastidores e ajudar a baixar a temperatura.
A ideia é que o ex-juiz diga que há um acordo com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para que ele não troque os servidores do órgão.
FONTE: https://www.midianews.com.br